A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), maior sociedade científica da América Latina, divulgou nesta segunda-feira (15) uma nota de repúdio ao que chama de “negacionismo favorecido pelo CFM”.
“Lembramos que ciência não é matéria de opinião. Protocolos de prevenção e de tratamento de doenças são desenvolvidos a partir de pesquisas, do laboratório aos seres humanos”, escreve a entidade.
“Não se decide se a Terra é redonda ou plana, se Marte é um planeta ou um holograma, por meio de enquetes de opinião, como essa ora realizada pelo CFM. Questões científicas são tratadas por cientistas, mediante procedimentos rigorosos e mundialmente consagrados”, completa o texto.
De acordo com o CFM, a enquete, conduzida através do seu site, busca “compreender o posicionamento da classe médica” sobre a imunização desse público.
No questionário, o conselho pergunta aos médicos se a aplicação do imunizante deveria ser obrigatória e se o profissional já atendeu crianças com diagnóstico ou complicações decorrentes da doença.
O texto ainda questiona se os pais e responsáveis “têm o direito de não optar pela imunização das crianças”.
Mais questionamentos
Em carta aberta conjunta, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) questionam a enquete feita pelo CFM. “ Esta pesquisa está aberta a todos os médicos, com quatro perguntas sem opção de argumentos ou comentários, desprovida de metodologia adequada para os objetivos propostos”, diz a nota.
“Existem claras evidências que apontam os benefícios da vacinação pediátrica na prevenção das formas agudas da doença, reduzindo o risco de hospitalizações, bem como suas complicações em curto e longo prazo na população pediátrica. Estas evidências apontam a necessidade de que tenhamos vacinas atualizadas e disponíveis para o grupo de crianças menores de 5 anos, onde ainda temos uma proporção significativa de crianças nunca infectadas e sem doses de vacina”, argumentam as duas entidades.
Sobre a autonomia dos médicos, a SBI e a SBP dizem que “todas as medidas de saúde pública devem ser seguidas pelos médicos ligados ao CRM (Conselho Regional de Medicina) e ao CFM (Conselho Federal de Medicina)”.
Também por meio de nota, a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) expressou preocupação em relação à iniciativa do CFM. Segundo a entidade, equiparar “crenças pessoais à ciência, como proposto pela pesquisa do CFM, pode gerar insegurança” na comunidade médica e afastar a população das salas de vacinação.
Histórico de polêmicas
O que diz o CFM
Em nota enviada ao g1 (veja a íntegra ao final da matéria), o CFM disse que não questiona a eficácia da vacina para crianças contra a Covid-19, apenas busca compreender a visão dos médicos sobre a obrigatoriedade.
Ainda segundo o conselho, a pesquisa visa ampliar o debate e ouvir a maioria da classe médica, respeitando outras entidades.
“O CFM respeita o direito de outras entidades médicas se posicionarem sobre a realização da pesquisa, entendendo que essas manifestações enriquecem o debate ético e científico, desde que não atendam a interesses pessoais, políticos, ideológicos ou financeiros”, diz o texto.
Sede do Conselho Federal de Medicina — Foto: CFM
Em 2023, a Covid-19 resultou em 5.310 casos de síndrome respiratória aguda grave (SRAG) e 135 óbitos entre crianças menores de 5 anos no Brasil, conforme informações do último boletim epidemiológico mais recente do Ministério da Saúde, abrangendo dados até novembro.
CFM esclarece pontos do levantamento sobre a percepção do médico acerca da obrigatoriedade da vacina de covid-19 em crianças
Com respeito à realização de pesquisa junto aos mais de 560 mil médicos brasileiros para conhecer a percepção dos profissionais acerca da obrigatoriedade de aplicação da vacina contra covid-19 em crianças de 6 meses a 4 anos e 11 meses, o Conselho Federal de Medicina (CFM) esclarece os seguintes pontos:
1)Em nenhum momento, o CFM contesta a eficácia ou a decisão do Ministério da Saúde de disponibilizar a vacina contra a covid-19 para a população infantil;
2) A pesquisa visa unicamente conhecer a percepção do médico brasileiro sobre a obrigação imposta aos pais para que as crianças de 6 meses a 4 anos e 11 meses sejam vacinadas, independentemente de prescrição médica da vacina contra COVID-19;
3) A decisão decorre de inúmeros pleitos encaminhados à autarquia buscando conhecer o posicionamento do CFM sobre esse tema, pois a bula da vacina disponibilizada pelo fabricante condiciona sua venda à prescrição médica;
4) Assim, o CFM decidiu ampliar o debate, dando direito a cada médico brasileiro de se manifestar, conhecendo a visão da maioria da classe;
5) Os médicos têm opiniões com base em conhecimento técnico-científico, são profissionais, pesquisadores e estudiosos em diversas áreas da ciência médica e por isso mesmo, são capacitados a se manifestarem sobre a obrigatoriedade da vacina contra COVID-19 em crianças de 6 meses a 4 anos e 11 meses;
6) Abordagens semelhantes foram usadas pelo CFM em outros temas, como telemedicina e publicidade médica, entre outros, oferecendo subsídios à autarquia e aos tomadores de decisão;
7) Além desse instrumento, o CFM informa que solicitou posicionamentos técnicos às suas Câmaras Técnicas de Pediatria, de Infectologia e de Bioética sobre a obrigatoriedade;
8) O CFM respeita o direito de outras entidades médicas se posicionarem sobre a realização da pesquisa, entendendo que essas manifestações enriquecem o debate ético e científico, desde que não atendam a interesses pessoais, políticos, ideológicos ou financeiros.
Finalmente, o CFM ressalta à população e aos médicos que empenha total apoio às ações empreendidas para ampliar a cobertura de vacinas que ajudam na prevenção e combate a doenças, como poliomielite, sarampo, meningite, rubéola e tuberculose, disponibilizadas dentro do Programa Nacional de Imunizações (PNI), considerado o maior do mundo em sua modalidade.